Na última eleição para governo, João tinha objetivos claros: derrotaria o candidato da situação e seria o governador de um importante estado da federação. Sabendo que não seria fácil, sua primeira tarefa foi providenciar recursos para pagar a empreitada.
Fez as contas e viu que o dinheiro do fundo partidário não conseguiria fazer frente ao adversário que, além de contar com apoio de fornecedores do governo, tinha um grande número de funcionários em cargos comissionados, que lhes serviriam de cabos eleitorais durante o período crucial.
João, apesar de ter uma quantia razoável de dinheiro próprio, resolveu procurar alguns empresários e amigos que pudessem ajudá-lo na sua campanha. Prometeu-lhes que suas provas de amizade seriam retribuídas em caso de vitória. Diante disso, conseguiu financiamento e foi atrás da montagem de sua equipe.
O marqueteiro, especializado em televisão, com uma série de vitórias famosas em seu currículo, foi o primeiro a ser escolhido. Em seguida, procurou uma pessoa de mobilização, capaz de contratar, orientar, mobilizar e pagar cerca de dois mil cabos eleitorais.
Contratou também um grupo que chamava de “economistas”. Intelectuais e pensadores capazes de montar um plano de governo que parecesse crível e factível.
Pesquisas caríssimas foram encomendadas. Identificou-se os bairros em que o candidato era reconhecido, os que ninguém tinha ouvido falar dele; a roupa que passaria a imagem de político comprometido e até as palavras ideais, para cada situação, que deveriam ser usadas. Nada de gravata preta, aliás, nada de gravata de cor alguma. O candidato deveria parecer “gente normal”.
A mídia tradicional local, que não lhe dava prova alguma de amizade, recebeu um conjunto de anunciantes ligados ao candidato, com a condição de serem, no mínimo, complacentes.
O circo estava montado. Havia dinheiro, profissionais de renome, equipes de rua e mídia amiga.
O marqueteiro, muito experiente, tratou de fazer o seu trabalho, e o fez muito bem. Nas primeiras semanas, a propaganda da televisão sequer mostrava o número da candidatura. Apenas vídeos do candidato, com seu nome, histórico familiar e seus amigos eram mostrados. A ideia de criar empatia com a população deu certo.
Nas semanas seguintes, propostas para melhorar a cidade, jingles envolventes, depoimentos de jovens com esperança nos olhos e gráficos que mostravam sua ascensão.
O site e as redes sociais foram um reflexo do que a televisão mostrava. As propagandas não mencionaram o endereço do site ou faziam qualquer tipo de divulgação da sua presença digital. Para todos – marqueteiro, candidato e equipe – a web era um canal sem muita relevância.
Nas últimas duas semanas, o candidato a governador passou a marcar seu número e pedir o voto. Chegou a invadir o tempo de televisão dos deputados para massificar seu pedido. Usou todo tipo de espaço que poderia ter.
Os adversários facilitaram sua vida, presos a conceitos tradicionais, não apresentaram nenhuma novidade que fosse ao encontro das necessidades da população.
O resultado não poderia ser outro: vitória! Apertada, por menos de 5%, mas vitória!
Os elementos do marketing político mudaram. O caminho da eleição mudou
Em resumo, as condições que possibilitaram que João fosse eleito, foram:
- Muito dinheiro
- Tempo de televisão
- Programas de televisão com produção profissional
- Equipe de rua numerosa
- Comunicação tradicional
- Adversários com mentalidade tradicional
- Mídia favorável
Com as novas regras eleitorais, definidas pela reforma política, João certamente perderia a eleição em 2018.
Sem recursos por causa da proibição do financiamento privado, como conseguiria contratar tantas pessoas? Como poderia pagar o marqueteiro famoso? De onde tiraria recursos para bancar programas de televisão com produção cinematográfica?
Como se não bastasse a falta de recursos, mesmo que João conseguisse que todos doassem seus trabalhos, a campanha foi reduzida por Lei. A televisão não terá mais que 30 dias para convencer eleitores. Candidatos a deputado federal e estadual não terão mais espaço nos blocos obrigatórios, somente poderão usar as inserções.
As mudanças atrapalharam quem pensa em campanha tradicional, mas favoreceram muito quem entende que há caminhos para estabelecer uma conexão com o eleitor.
Uma revolução na comunicação e no marketing digital eleitoral
A presença digital de um candidato pode ser trabalhada a qualquer tempo. Ficou proibido apenas o pedido de voto antes do período eleitoral, mas qualquer candidato pode construir sua base usando seus sites e perfis em redes sociais, na chamada pré-campanha.
A possibilidade do sistema de financiamento coletivo, mais do que uma ferramenta para arrecadar recursos, é uma forma de levar a mensagem dos candidatos a sua militância e seus eleitores.
Também como novidade, creio que a mais importante, é a permissão do impulsionamento de publicações em redes sociais. Antes do impulsionamento tínhamos que usar a internet como quem usa a televisão, fazendo uma mensagem e torcendo para que ela impactasse o maior número de pessoas. Agora podemos escolher as mensagens certas, de acordo com os interesses dos eleitores.
Hoje, o candidato que apostar na televisão como prioridade, terá chance apenas se disputar com outros que tenham o mesmo pensamento. Mas, será derrotado nas urnas em caso de disputa com alguém que se preocupa em formar base de simpatizantes, captar mailing de endereços de e-mails e números de celular, apresentar um discurso transparente e coerente, segmentado de acordo os interesses dos públicos alvo. Para isso é preciso uma equipe bem preparada, multidisciplinar, que não entenda somente a comunicação, mas também o marketing digital para campanhas eleitorais, e como a política funciona.
O que fará a diferença na próxima eleição é o entendimento que cada candidato tem do novo jogo que acontecerá, uma campanha transmídia. Como em tudo, o que se adaptar sobreviverá. O que preferir acreditar que tudo será como antes, deverá ter uma surpresa amarga em 2018.